sábado, 26 de junho de 2010

Invictus

Enquanto tudo acontece, enquanto a copa do mundo torna-se o evento do momento, nem tudo se vê, nem tudo se fala e pouco se pensa. Notícias, belezas, cultura e a mesma ladainha de sempre em textos sentimentais. Filmes que contam o que aquele povo viveu, documentários em museus e alegria colorida de uma nação... No entanto, nada disso será suficiente quando a copa acabar e o mundo passar a pensar em algum outro evento de alguma outra importância social ou cultural. Tudo bem, é esporte. Mas é quase insuportável ler e ouvir o que se escreve sobre esse "momento histórico". Os discursos de poder e manipulação tentam nos levar para algum lugar comum, tentam nos entreter, mas é preciso pensar, conhecer, ir em busca de outras vozes que com certeza não estão sendo ouvidas.
Enfim, tendo em vista que se fala todo tempo da Copa+África+Cultura, encontrei um poema lido por Mandela enquanto esteve durante 27 anos na prisão e que imagino, nem todos saibam, dá nome ao filme do momento: "invictus",sobre a copa de rugby na África e sobre como Mandela consegue utilizar o esporte para amenizar um sentimento de separação e repulsa. Há diversas críticas ao filme, mas não é esse o meu ponto principal no momento; quero antes pensar nesse "invencível" e em como importa saber o que se está fazendo e por que se está fazendo.Algo mais a pensar.

Invictus

De dentro da noite que me cobre,
Negra como a cova, de ponta a ponta,
Eu agradeço a quaisquer deuses que sejam,
Pela minha alma inconquistável.

Na cruel garra da situação,
Não estremeci, nem gritei em voz alta.
Sob a pancada do acaso,
Minha cabeça está ensanguentada, mas não curvada.

Além deste lugar de ira e lágrimas
Avulta-se apenas o Horror das sombras.
E apesar da ameaça dos anos,
Encontra-me, e me encontrará destemido.

Não importa quão estreito o portal,
Quão carregada de punições a lista,
Sou o mestre do meu destino:
Sou o capitão da minha alma.

O poema foi escrito em 1875 por Willian Ernest Henley.

quinta-feira, 24 de junho de 2010

Dizer.


Quando você decide dizer algo, nada mais será igual. Você decidiu dizer e precisa assumir as consequências que poderão vir junto com essa decisão. Não é fácil ir contra o que já está feito, não é simples lutar contra um sistema que é organizado sutilmente e no silêncio da ignorância e do descaso. Dizer alguma coisa ou fazer algo que mexa com as estruturas, exige esforço, exige trabalho e pensar em algumas situações, talvez em muitas, chega a doer. Muitos exemplos tenho presenciado de palavras que podem mudar e de atitudes que não se cansam de injuriar os sistemas. Contudo, o que parece, às vezes, é que falta direção, falta objetivo claro para que as coisas aconteçam de forma diferente. As pessoas precisam sair da zona de conforto, dizer as coisas sabendo o que estão dizendo e entendendo que nada mais será igual caso você saiba do que está falando ou o que está fazendo. Falta sentido. Falta pensar sobre o "dizer". Falta assumir. E muito me incomoda o que tenho visto por aí: uma cretinice sem tamanho, uma preguiça de pensar, uma aceitação e uma serenidade com a brutalidade, uma indiferença que ecoa dia após dia na "inutilidade" de saber o que dizer, na falta de percepção de que o outro só existe em contraste com o "eu". O que será que estão querendo dizer essas atitudes apáticas? Por que não é preciso mais saber dizer?

sexta-feira, 18 de junho de 2010

Ficam as palavras.


Sexta-feira, 18 de junho de 2010. Um dia chuvoso, nada anormal nisso, afinal estamos quase no inverno. As atividades seguem, o mundo continua seu ritmo de sempre. No entanto, um "new tweet" mudou esse dia normal: "celinaluiza A literatura fica mais pobre... morreu, hoje, aos 87 anos, Jose Saramago...grande escritor português... #sadness" O que dizer depois dessas palavras que quando juntas constroem um sentido que não é fácil de se aceitar?
A vida e as palavras deste escritor foram diferentes: seu estilo violador de regras e sua postura crítica , as polêmicas em torno de suas (re)construções literárias, a ruptura e os questionamentos acerca de uma História com "aga" maiúsculo, a remontagem das visões dos fragmentos de mundo e de saberes, a exposição e o confrontamento do sujeito-leitor com textos que contestem a "Verdade".
É difícil saber que perdemos alguém como Saramago, mas as palavras ficam e afinal é o que podemos deixar registrado: palavras, palavras-pensadas-pensantes-pensáveis.

“aqui, onde o mar se acabou e a terra espera” (Trecho final de o Ano da Morte de Ricardo Reis.)
Trecho de texto postado no blog de Saramago:
“Falei de cultura. Porventura serei mais claro se falar de revolução cultural, embora saibamos que se trata de uma expressão desgastada, muitas vezes perdida em projectos que a desnaturaram, consumida em contradições, extraviada em aventuras que acabaram por servir interesses que lhe eram radicalmente contrários. No entanto, essas agitações nem sempre foram vãs. Abriram-se espaços, alargaram-se horizontes, ainda que me pareça que já é mais do que tempo de compreender e proclamar que a única revolução realmente digna de tal nome seria a revolução da paz, aquela que transformaria o homem treinado para a guerra em homem educado para a paz porque pela paz haveria sido educado. Essa, sim, seria a grande revolução mental, e portanto cultural, da Humanidade. Esse seria, finalmente, o tão falado homem novo.” (postado em 07/05/09.)
http://caderno.josesaramago.org/category/o-caderno-de-saramago/page/2/

"Todo construir começa com o dançar de idéias" F. Nietzsche


"Todos sabemos que cada dia que nasce é o primeiro para uns e será o último para outros e que, para a maioria, é so um dia mais." Saramago

terça-feira, 15 de junho de 2010

Poesia musicada



Nada melhor que uma boa música e um bom livro. Cada um de nós acredita em algo que nos move. Eu teimo em pensar que a poesia aliada à música pode muito.

domingo, 13 de junho de 2010

.Isto.Isso.Aquilo.


"Escrevo rangendo os dentes" O que deveria estar pensando Álvaro- Pessoa- Campos ao escrever sobre um escrever "rangedor de dentes"? O poeta do fazer, do fragmento, escreve, instiga, conta mais do que poderia e menos do que gostaria. É o próprio fingidor em sua essência que faz pensar e sentir e que nesse pensar causa um impacto na vida de quem o lê, não podendo este voltar atrás nas mudanças trazidas pelo "caleidoscópio em movimento" como ele mesmo se designava e, logo, sua poesia. Uma alma barroca que se veste de outras várias e que representa tão bem o tempo que vivemos: um tempo sem tempo e sem lugar, um tempo sem memória, perdido e encontrado, uma colisão de pedaços de almas e de saberes não bem compreendidos ou compreensíveis.
Leio porque preciso, leio porque me alimenta e porque o não saber é cada vez mais sufocante, quando se percebe que nada se sabe. É a infinitude da Biblioteca de Babel de que falava Borges e que em vão tentamos enfrentar e que nos leva ao caos interno, nos leva à eterna busca pelo que pensamos poder saber.
"Tenho febre e escrevo" Poeta fingidor. Poeta do sentir.

Isto
Fernando Pessoa
Dizem que finjo ou minto
Tudo que escrevo. Não.
Eu simplesmente sinto
Com a imaginação.
Não uso o coração.

Tudo o que sonho ou passo,
O que me falha ou finda,
É como que um terraço
Sobre outra coisa ainda.
Essa coisa é que é linda.

Por isso escrevo em meio
Do que não está ao pé,
Livre do meu enleio,
Sério do que não é.
Sentir? Sinta quem lê!

quarta-feira, 9 de junho de 2010

Um pouco de Fernando Pessoa vestido de Álvaro de Campos


Álvaro de Campos
Lisbon Revisited
(l923)

NÃO: Não quero nada.
Já disse que não quero nada.

Não me venham com conclusões!
A única conclusão é morrer.

Não me tragam estéticas!
Não me falem em moral!

Tirem-me daqui a metafísica!
Não me apregoem sistemas completos, não me enfileirem conquistas
Das ciências (das ciências, Deus meu, das ciências!) —
Das ciências, das artes, da civilização moderna!

Que mal fiz eu aos deuses todos?

Se têm a verdade, guardem-na!

Sou um técnico, mas tenho técnica só dentro da técnica.
Fora disso sou doido, com todo o direito a sê-lo.
Com todo o direito a sê-lo, ouviram?

Não me macem, por amor de Deus!

Queriam-me casado, fútil, quotidiano e tributável?
Queriam-me o contrário disto, o contrário de qualquer coisa?
Se eu fosse outra pessoa, fazia-lhes, a todos, a vontade.
Assim, como sou, tenham paciência!
Vão para o diabo sem mim,
Ou deixem-me ir sozinho para o diabo!
Para que havemos de ir juntos?

Não me peguem no braço!
Não gosto que me peguem no braço. Quero ser sozinho.
Já disse que sou sozinho!
Ah, que maçada quererem que eu seja da companhia!

Ó céu azul — o mesmo da minha infância —
Eterna verdade vazia e perfeita!
Ó macio Tejo ancestral e mudo,
Pequena verdade onde o céu se reflete!
Ó mágoa revisitada, Lisboa de outrora de hoje!
Nada me dais, nada me tirais, nada sois que eu me sinta.

Deixem-me em paz! Não tardo, que eu nunca tardo...
E enquanto tarda o Abismo e o Silêncio quero estar sozinho!

terça-feira, 1 de junho de 2010

Do que a gente sente e pensa


Música e poesia.
Não há quem viva sem. Algumas pessoas podem não perceber, mas vivemos em um mundo que respira poesia e inspira melodias. Nem todas boas, nem todas ruins e isso depende do espaço e do lugar que cada um ocupa (temporariamente, não se esqueça).
Sempre que posso, ouço uma música e tenho meus rituais da poesia. Acredito realmente que isso torna o meu dia melhor e que, é como uma purificação de todas as coisas complexas pelas quais passamos. Coloco meu fone de ouvido, pego meu livro de poesias e é como se eu pudesse ser melhor.
Claro que cada um vê as coisas do que lugar que puder ou que quiser ver, no entanto, mudar, revirar o nosso redor, talvez seja uma experiência que valha a pena. Não quero dizer que saiba exatamente o que estou fazendo. Só sei que "me faz feliz".

Do entre-lugar: Parte "outra"

Do entre-lugar: Parte 1: A poesia

POESIA: “words set to music”(Dante
via Pound), “uma viagem ao
desconhecido” (Maiakóvski), “cernes
e medulas” (Ezra Pound), “a fala do
infalável” (Goethe), “linguagem
voltada para a sua própria
materialidade” (Jakobson),
“permanente hesitação entre som e
sentido” (Paul Valery), “fundação do
ser mediante a palavra” (Heidegger),
“a religião original da humanidade”
(Novalis), “as melhores palavras na
melhor ordem” (Coleridge), “emoção
relembrada na tranqüilidade”
(Wordsworth), “ciência e paixão”
(Alfred de Vigny), “se faz com
palavras, não com idéias” (Mallarmé),
“música que se faz com idéias”
(Ricardo Reis/Fernando Pessoa), “um
fingimento deveras” (Fernando
Pessoa), “criticismo of life” (Mathew
Arnold), “palavra-coisa” (Sartre),
“linguagem em estado de pureza
selvagem” (Octavio Paz), “poetry is to
inspire” (Bob Dylan), “design de
linguagem” (Décio Pignatari), “lo
impossible hecho possible” (Garcia
Lorca), “aquilo que se perde na
tradução (Robert Frost), “a liberdade
da minha linguagem” (Paulo
Leminski)…

Ninguém melhor que Leminski para explicar através da Linguagem o pensamento que se tem sobre a própria Língua(gem).